VIII – Os suportes do desenho

Os suportes influenciaram o desenho tanto quanto os procedimentos técnicos, que são muitos e de naturezas diversas. Uma pequena parede de rocha foi o suporte do desenho pré-histórico. Desenhou-se sobre ossos polidos, muros, troncos de árvores cortadas, placas de cera e etc. Excetuando o caso do papiro, largamente utilizado pelos egípcios, todos os outros suportes  essenciais só serão encontrados a partir da idade média, como as tabuletas, o pergaminho e o papel.

 

A tabuleta

Cenninno Cennini, que utilizou vários desses suportes, nos fala em primeiro lugar das tabuletas, onde desde o início os aprendizes se exercitavam. As tabuletas eram de dois tipos: umas feitas de bucho (madeira dura e sem veios) ou figueira e recebiam uma camada de preparação de pasta de ossos. O outro tipo era revestido de pergaminho, preparado também com uma pasta de branco a base de óleo. Essas tabuletas eram muitas vezes unidas por anéis de couro e compunham, assim, uma espécie de caderno para desenhar. Um desses cadernos, do século XIV, está conservado na coleção da biblioteca Pierpont Morgan, em Nova Iorque e uma outra, da escola de Colônia, do começo do século XV, se encontra na Albertina, em Viena. Ainda, no inventário do rei René, morto em 1480, há a menção de “uma tabuleta de oito folhas de onde foram retirados os retratos com ponta de chumbo do rei da Sicília, da rainha, do senhor da Calábria e de outros senhores.”

As tabuletas foram usadas correntemente na Itália até um período avançado do Quattrocento, onde cumpriam importante papel pedagógico nos ateliês, já que eram reaproveitáveis, num momento em que o uso do papel ainda era restrito, devido aos seus altos custos de produção.  Na Alemanha, isso se repete até meados de 1550.

O pergaminho

Os mais antigos desenhos que chegaram até nós, como os do Saltério de Utrecht, do tesouro da catedral de Auxerre e do álbum de Villard de Honnecourt, são feitos sobre pergaminho. Pode se dizer o mesmo da maior parte dos desenhos italianos do Treccento. Empregavam-se mais frequentemente as peles de cabra ou carneiro. A era do pergaminho termina na Toscana do século XIV, mesmo tendo prolongado seu uso na Itália setentrional, com Pisanello e Jacopo Bellini. Nas escolas do norte, onde a penetração do papel foi um pouco mais lenta, a tradição do pergaminho se manteve, principalmente entre os gravadores, até o final do século XVI. Os pintores, como Albrecht Dürer, de fato não os abandonaram totalmente. Também se continuou utilizando as peles de animais para aqueles desenhos aos quais se dava uma importância particular e aos quais se queria assegurar uma conservação maior.

O pergaminho será retomado na Holanda no séc. XVII, numa moda adotada por vários artistas da época. Moda que ganha adeptos também na França. Esse gênero de desenho, que requeria as mais belas peles, os “velins” que eram peles retiradas de animais muito jovens, torna-se uma espécie de luxo, de que só se serviam ocasionalmente, cultivado mais por manutenção de tradições, do que por razões estilísticas. O uso do pergaminho praticamente desapareceu no séc. XVIII.

 

O papel

É da China que nos vêm, através dos árabes, a indústria do papel. No ano 700, venceram a batalha de Samarcanda contra os chineses, com quem aprendem a sua fabricação. Desde o século XI, na Espanha, em Xantia e XIII, na Itália, em Fabriano, estabelecem-se as duas fábricas mais antigas da Europa. Outras foram sendo criadas em seguida, em diferentes cidades da Itália, da Espanha e de todos os países que eram centros importantes de produção artística.

Até o século XII, o papel era caro e raro. Mais frágil que o pergaminho, seu uso era esporádico. A partir do século XV é que sua disseminação começa se dar, muito em função do nascimento da gravura de estampa, que vai elegê-lo como suporte essencial. Também fundamental para o crescimento de sua fabricação é a nascente indústria do livro impresso.

Pode-se fixar, um pouco arbitrariamente, o começo do século XIV como a época em que o papel vai entrar nos ateliês dos artistas. Os mais antigos papéis do ocidente são de trapo, feitos de linho ou cânhamo, diferentes dos papéis orientais construídos diretamente a partir de fibras vegetais. Eram de textura grosseira, espessos, fibrosos e imperfeitamente encolados. No tempo de Cenninno Ceninni, as fábricas já faziam um papel de textura mais fina, mais lisa, bem encolados e que podiam receber inclusive traços de pena. Isso podemos atestar, tanto pelo testemunho desse autor quanto pelos desenhos deste período, que sobre papel já são feitos com uma ampla gama de materiais e instrumentos. O desenho passa então a ter como seu suporte privilegiado os muitos tipos de papel produzidos a partir do Renascimento, levando em conta a diversidade de funções e usos que esse desenho passa a requerer.

As várias demandas, partir do séc. XVII, de novos materiais, de novos usos do desenho, passaram a exigir dos diversos moinhos fabricantes de papel, soluções cada vez mais específicas e sofisticadas. Também as quantidades de produção cresceram mais e mais na medida em que a indústria de impressão assim o exigia, como por exemplo, na invenção do papel de cilindro contínuo, na Inglaterra do Século XIX, quando a imprensa diária estabeleceu-se como um hábito em toda a Europa e em seguida no resto do mundo.

No início, o tom de branco do papel variava de acordo com a fibra, mas muitas vezes os artistas aplicavam superfícies de cor, preparando assim fundos particulares para seus desenhos, como pudemos ver mais acima nesse texto. A partir dessas práticas, o engenho dos fabricantes de papel descobre meios de empregar a cor diretamente na pasta do papel, criando assim toda uma gama de papéis coloridos. Muitos deles ganharam fama, como o papel azul feito em Veneza, no séc. XV, conhecido como carta turchina ou azurrea, provavelmente imitando papéis do oriente.

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